sexta-feira, 27 de abril de 2012

MULHER PIONEIRA - LOCOMOTIVA 36 MIL


3 LETRAS E UMA QUESTÃO DE GÊNERO

Já fui chamada de louca, guerrilheira, porém prefiro dizer que não sou assim, sou tão somente firme nos meus propósitos, exigente no cumprimento de direitos e deveres e uma guerreira-sonhadora.
Assim, num dos meus delírios ideológicos, insone, resolvi contar um fato que havia se perdido no tempo e me foi trazido à memória por minha amiga Marta, em 17 de março de 2012 – quando saíamos do evento em comemoração aos 30 anos da Turma Maria Quitéria (pioneiras na Força Policial do Rio de Janeiro).
Gente! Como uma sigla, apenas três letrinhas, tinha o poder de alterar o curso de uma história?
Pois é, apenas três letrinhas, no ano de 1983, impediram que nós mulheres realizássemos as provas para o concurso que estávamos inscritas – o CFC/QPMP-6. Isso mesmo! Fomos impedidas, cerceadas do direito de fazer as provas para o Curso de Formação de Cabos do Quadro de Saúde por sermos Soldados Policiais Militares FEM.
Éramos umas dez, com formação específica, capacitadas tecnicamente para o exercício das funções, inscritas para o certame, mas éramos FEM e, de acordo com as informações que nos passaram trinta minutos antes de a prova ser iniciada, o concurso se destinava aos soldados Policiais Militares (o edital também não fazia referência ao detalhe de gênero – nele não se inseria nenhuma observação que especificasse o gênero masculino, não havia letrinhas discriminatórias).
Dizem que contra a força não há argumentos, mas também é certo que o Direito não ampara aos que dormem.
Inaceitável... 3 letrinhas não poderiam ter a força de nos barrar e modificar a história que ainda escreveríamos!
Como olharíamos para a sociedade carioca? Com a cara de quem se acomodou ante um ato institucional “não pensado” e permeado pelo discurso hegemônico da distinção de gênero?
Claro que não!!!
Tentamos juntas, de todas as formas possíveis, reverter ali mesmo a situação, mas não conseguimos êxito na empreitada, apesar de os Oficiais responsáveis pela aplicação das provas mostrarem-se simpáticos aos nossos argumentos. Era sabido: ordem dada é ordem cumprida, não havia chance de mudança naquele momento tenso.
Saí do CFAP direto para o QG e apresentei ao Diretor da DEI toda nossa indignação fundamentando minhas razões e pleiteando a tão sonhada igualdade, contudo sem perder de vista os princípios da hierarquia e disciplina.
Minha voz encontrou eco e no mesmo dia as provas realizadas pelos homens foram anuladas, o concurso adiado aguardando nova publicação em BOL PM. Pela primeira vez, na PMERJ, uma mulher iniciava, mesmo sem plena consciência da importância futura para o quadro feminino, um movimento de igualdade, de valorização da força do trabalho feminino na Instituição. Mais tarde, esse fato serviria de parâmetro para novas demandas.
Inaugurou-se nesse dia uma nova cultura na Caserna e eu no meu mergulho interior sinto-me, hoje, mais forte para continuar contando histórias!

Tania Loos 
Em, 27ABR2012

Um comentário:

  1. Você foi um divisor de águas na nossa vida de FEM. Me orgulho da tua loucura, sensibilidade e brilhantismo. Uma "figura", uma mulher admirável!

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